Um dos meus primeiros empregos foi numa indústria no subúrbio do Rio de Janeiro. Eu trabalhava com pessoas maravilhosas que me ensinaram muito, com camaradagem e generosidade, todas simples e com um sorriso eterno no rosto. Meu chefe era um sujeito complexo, cheio de manias, mas tinha um coração maior que ele próprio. O lugar era pequeno, espartano, mal iluminado, com máquinas antigas, algumas obsoletas, e limpeza não era um grande destaque. Apesar de tudo, eu adorava aquilo. Até hoje essa experiência ocupa um lugar carinhoso na minha memória.
Nos últimos anos, a grande mídia passou a publicar matérias celebrando locais de trabalho alternativos, alguns repletos de equipamentos para diversão, até com escorregadores, mesas de jogos e puffs em formatos bem estranhos. Em alguns escritórios rola até comida grátis ao longo do dia. Tudo isso é muito bacana. Eu realmente acho legal e acredito que muitos considerarão isso como um enorme diferencial para escolher um lugar para trabalhar. O que me incomoda é a supervalorização dada a esse mundo de entretenimento e lazer. Afinal, as paredes coloridas não valem de nada se os seus colegas de trabalho são cinza.
Recentemente, dentro do avião, numa ponte área do Rio para Sampa, li uma matéria na revista da Gol número 171 chamada “Aqui é trabalho!”. A matéria começa assim: “Imagine trabalhar olhando para o mar azul transparente das Filipinas, com direito a mergulhos esporádicos entre um e-mail e outro. Parece bom demais para ser verdade. Pois foi assim que o casal de publicitários Manoela Pontual e Raphael Rotta, 27 anos, decidiu viver. Eles não tiraram um ano sabático nem largaram tudo. Apenas perceberam que, graças à tecnologia, poderiam fazer seu trabalho de qualquer canto do mundo”. A matéria segue falando de gente que trabalha em lugares diferentes, com jornada hiper blaster flexível no trabalho, home office e ambientes de trabalho super transados. A matéria basicamente louva a flexibilidade no trabalho e enaltece quem pode ser dono do próprio tempo e não ter a presença de um chefe.
Obviamente que escritórios com espaços para diversão e home office são coisas legais, realmente agregam mais qualidade de vida e satisfação no trabalho, mas não são tão essenciais quanto todas essas matérias falam. Trabalhar num lugar com móveis transados é bacana, mas o importante não é o lugar onde você trabalha, mas é com quem você trabalha, e qual é o real propósito da empresa na qual você sua a camisa todos os dias. Essas são as partes mais importantes da equação.
Um excepcional artigo chamado “Para Modernizar as Organizações, Precisamos Muito Mais do que Paredes Coloridas e Comida Grátis”, assinado por Ligia Zotini, faz uma reflexão maravilhosa e traduz exatamente o que penso a respeito dessa ode exagerada às paredes coloridas. De que valem as paredes e o mobiliário moderno sem as pessoas? Na verdade, o que faz o ambiente de trabalho ficar colorido são as pessoas.
São as pessoas que devem ser coloridas e divertidas. Pessoas alegres, confiantes e com propósito são capazes de colorir qualquer ambiente cinza. Você trabalha em um lugar que te permite se desenvolver profissionalmente? Existe um ambiente saudável de confiança e relacionamento? O seu chefe é seu parceiro nos bons e maus momentos? A empresa na qual trabalha tem um propósito digno que vai muito além de meramente buscar o lucro? O seu trabalho ajuda você a se tornar um ser humano melhor? Essas são questões importantes, independentemente da cor da parede e do estilo da cadeira.
Portanto, prometi a mim mesmo que não vou mais ler matérias sobre escritórios molico, paredes coloridas no trabalho, bilhares, comida grátis e escritórios no mar azul das Filipinas. Já deu! Em vez de ler sobre paredes coloridas, eu quero ler sobre pessoas coloridas.